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Doenças raras em crianças. Como suspeitar?

  • faissolnatalia
  • 30 de set.
  • 4 min de leitura

No Brasil, consideram-se doenças raras aquelas que afetam até 65 pessoas a cada 100 mil habitantes. Apesar de serem individualmente raras, em seu conjunto elas representam mais de 7 mil tipos diferentes e, periodicamente, novas são identificadas.


doenças raras

Como médica geneticista, é  relativamente comum  que eu atenda em meu consultório pais que travam longas jornadas em busca de respostas para sintomas apresentados por seus filhos. Infelizmente, a dificuldade do diagnóstico precoce faz parte da realidade da maioria dos casos de doenças raras em crianças.


As doenças raras podem ter diferentes causas – infecciosa, autoimune, tumoral ou mesmo desconhecida –, mas predominam (80%)  as de  origem genética. Outra informação importante é que grande parte das doenças raras se manifesta na infância.

 

Mas por que o diagnóstico precoce é um desafio?


Isso acontece por alguns motivos. Vou destacar os três que considero mais importantes. Primeiro, pela raridade individual. Em função disso, muitos médicos nunca verão um caso de determinada síndrome durante toda a carreira. Segundo, porque são condições que frequentemente apresentam sintomas inespecíficos no início, que são facilmente confundidos com  doenças comuns. Terceiro,  porque eles variam muito e pacientes com a mesma doença podem apresentar sintomas diferentes.

 

É por isso que após o aparecimento do primeiro sintoma, o diagnóstico adequado pode levar anos. Muitos pacientes demoram para obter o diagnóstico e tão grave quanto isso, em muitos casos, recebem o diagnóstico errado. Apesar da maioria das doenças raras não ter cura, elas contam com tratamentos que podem ter impacto positivo na qualidade de vida do paciente. Cada dia de atraso no diagnóstico e, consequentemente, no início do tratamento, pode resultar em sequelas irreversíveis que poderiam ter sido evitadas.

 

Sinais de alerta de doenças raras em crianças


Nós, profissionais de saúde, assim como pais e familiares precisamos estar atentos a sinais que podem indicar a necessidade de investigação mais aprofundada. Cerca de metade dos pacientes com doenças raras são crianças, e existem sinais de alerta que devem ser observados nos primeiros anos de vida.


Vamos ficar alerta em casos de:

 

  • Dificuldade de crescimento ou ganho de peso inadequado - quando a criança começa a sair da curva de crescimento esperada para sua idade, sem causa nutricional aparente.


  • Atraso no desenvolvimento neuropsicomotor - demora para sustentar a cabeça, sentar, engatinhar, andar ou falar. Atraso significativo no desenvolvimento motor ou da linguagem.


  • Regressão (perda de habilidades já adquiridas) -  sempre um sinal preocupante porque pode indicar doenças metabólicas ou neurodegenerativas.


  • Aparência física muito diferente de outras pessoas da família - características faciais atípicas podem ser pistas diagnósticas importantes. O conjunto dessas características pode formar um padrão reconhecível.


  • Pouca atividade ou cansaço excessivo durante as brincadeiras -  crianças que não acompanham o ritmo de outras da mesma idade ou que se cansam facilmente podem estar manifestando sinais de doenças musculares, cardíacas ou metabólicas.


  • Sintomas peculiares ou incomuns – entre eles,  queimação nas mãos e nos pés, sede excessiva, urina em grande quantidade, alterações oculares ou comprometimentos musculares progressivos.


  • Múltiplas malformações ou defeitos congênitos  - sinais que são observados no bebê ao nascer ou identificados em ultrassonografia pré-natal, aumentam  a probabilidade de causa genética.


  • Histórico familiar sugestivo - consanguinidade entre os pais, histórico de abortos de repetição, mortes neonatais inexplicadas ou familiares com sintomas semelhantes.


  • Mudanças de postura, comunicação comprometida ou deficiência intelectual - especialmente quando associados a outros sintomas.

     

Papel estratégico do pediatra


O pediatra tem função vital no diagnóstico precoce. Em geral, é o colega dessa especialidade que encaminha a criança para o médico geneticista para confirmar uma suspeita diagnóstica. Nas consultas, para suspeitar de uma doença rara, o pediatra não apenas avalia o desenvolvimento, mas se preocupa em construir uma história clínica detalhada da criança, contemplando, entre outros aspectos:


  • Histórico gestacional e do parto

  • Desenvolvimento mês a mês da criança

  • Histórico familiar detalhado de pelo menos três gerações (heredograma)

  • Origem geográfica da família

  • Sintomas aparentemente não relacionados

 

Estar atento ao diagnóstico para tratar é muito importante. Quanto mais cedo o diagnóstico, mais eficiente é o tratamento e maior a chance da criança ter sintomas controlados e um melhor desenvolvimento.

 

Teste do pezinho e da bochechinha


O teste do pezinho, um exame de triagem feito entre o 3º e 5º dia de vida do bebê, é fundamental. Esse exame identifica condições como fenilcetonúria, hipotireoidismo congênito, fibrose cística, anemia falciforme, hiperplasia adrenal congênita e deficiência de biotinidase. Existe também outro teste de triagem, o teste genético da bochechinha (triagem neonatal molecular), que analisa o DNA do bebê através de coleta de material da bochecha. Este exame pode investigar alterações em mais de 320 genes relacionados a diversas doenças raras.

 

A importância da avaliação de um médico geneticista e dos testes genéticos


O médico geneticista pode contribuir significativamente no processo de avaliação, aconselhamento genético, diagnóstico e acompanhamento desse paciente. É ele também quem vai orientar sobre qual teste genético deve ser realizado para confirmar ou não o diagnóstico.


Ter acesso a esses testes genéticos é muito importante para reduzir o tempo de espera do diagnóstico e evitar sequelas irreversíveis. Tecnologias como o sequenciamento de nova geração (NGS) permitem avaliar múltiplos genes simultaneamente, acelerando significativamente o diagnóstico de uma doença rara.


Esse olhar do médico geneticista possibilita que as famílias entendam os riscos e juntos possam planejar as condutas para trazer mais qualidade de vida ao paciente.

 

Fique atento


Se você percebe que algo não está bem com o desenvolvimento de seu filho, confie em seu instinto. Você convive diariamente com a criança e conhece suas particularidades. Converse com o médico de seu filho sobre o que observou.  O diagnóstico de doenças raras em crianças exige olhar atento, conhecimento atualizado e, principalmente, disposição para investigar quando algo não está certo.

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Médico responsável: Dr. Natalia Faissol - CRM 102.004-8 /  RQE 51847   
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